A ausência da cor



Parei de sonhar colorido demais, ofuscava minha visão. Tive que me acostumar com tons opacos que misturavam tons cinzas e fracos. O verde fluorescente foi trocado pelo musgo. Enxerguei tudo craquelado e irreparável. O sol foi trocado por um céu completamente cinza e ameaçado por uma grande tempestade. Andei pensando em consertar os meus cacos quebrados, mas as peças faltosas continuavam em falta no final. Muito preto e branco, a minha vida perdeu a cor que me era essencial e fundamental. Meus sonhos foram diretamente prejudicados e alterados. Resolvi pintar objetos com cores alegres, tentar mudar a minha situação, mas este não é o problema, o colorido da minha vida era só a maneira que eu antes enxergava, e por mais forte que uma tinta possa parecer ela não possui poder nenhum sobre o que me ocorreu. Senti vontade de cortar meus pulsos pra manchar esta monotonia, tenho certeza que esta é a minha última alternativa e neste momento a única coisa que eu posso fazer. Mas assim como a cor, toda a coragem e revolta também se foram. Minha força é menor a cada dia que amanhece sem sol, e a cada noite sem luar, o escuro do meu quarto é tudo que eu tenho, e é assim que ele permanece dia após dia, independente de que hora seja. Na verdade não tem a menor importância saber o que marca o relógio, porque tudo fica exatamente igual. Esta daltônica experiência se transforma em cegueira absoluta. Um milhão de anos, horas atrás, vidas passadas, eternidade, me perdi num transe que não sei se haverá fim. Espaços ou vácuos, multidões espalhadas num mundo que eu mal consigo imaginar. E eu só quero sonhar, sentindo o sol me tocar no rosto, só quero ver o pigmento de uma folha caindo de uma árvore alta.
Eu começo a chorar, e choro tanto que penso que nunca mais irei parar, choro por horas, dias, talvez. Eu posso banhar o mundo inteiro com minhas lágrimas, elas demoraram tanto para tomarem forma que mais parece um rio que corre sem pausas. Eu transbordo dentro de mim, eu posso sentir, e num relance em meio a soluços vejo uma fresta de luz na janela e sei que posso sorrir.
Hoje aproveitei o sol e deixei minha alma estendida para secar, tirar o cheiro do mofo e prepará-la para uma nova fase que não tarda a chegar.

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